Desde cozinhar seu jantar até decidir em qual novo projeto investir na empresa, você passa por um processo de tomada de decisão várias vezes durante o dia. Algumas decisões são tão automáticas que você nem pensa nelas. E as decisões que você pensa sobre (e coloca horas de pesquisas) podem não ser tão objetivas e racionais como imagina.
Ao invés disso, você acaba deixando de lado esses preconceitos que influenciam no processo de tomada de decisão da sua empresa e que tem um enorme impacto nos resultados das suas escolhas.
Os preconceitos, mais especificamente os preconceitos cognitivos, são tendências ou viés não controladas para tomar decisões ou agir de forma irracional. Esse conceito foi introduzido no início da década de 70 por psicólogos que publicaram suas descobertas em 1982 no livro Judgment Under Uncertainty (Julgamento sobre Incertezas, sem tradução no Brasil). Eles descobriram que ao invés de tomarmos decisões baseadas em fatos e dados, nós estamos mais propensos a basear nossas decisões em erros inconscientes que nos levam a um julgamento distorcido do mundo.
Esses preconceitos afetam diretamente nossos relacionamentos, trabalho e visão do mundo.
Vamos mais a fundo entender como o processo de tomada de decisão é formado no cérebro humano e conhecer sete pensamentos tendenciosos que aterrorizam seu trabalho e minam seu sucesso.
Seu cérebro e preconceitos = Uma união preguiçosa
Não há dúvida que o cérebro é um órgão poderoso. Ele é capaz de realizar 1016 processos por segundo, ao mesmo tempo que toma centenas de decisões todos os dias, desde onde almoçar, até quando seu produto deve entrar em um novo mercado. Apesar de seu poder, o cérebro é preguiçoso.
Eis o que acontece: o cérebro cria atalhos para tomar decisões rápidas quando recebe muita informação ou precisa estimular a criatividade. Esses atalhos formam preconceitos inconscientes e fica mais fácil para seu cérebro categorizar informação e fazer julgamentos rápidos repetidas vezes.
Mas você nem imagina que isso está acontecendo, na verdade. As imagens de ressonância magnética e o Harvard Implicit Association Test (IAT) revelam que “o processo de tomada de decisão aciona automaticamente a parte do cérebro responsável pelo processamento inconsciente.” A região é a parte emocional do cérebro (a amígdala) que corresponde ao medo. O teste mostrou que o aumento da atividade da amígdala ocorre quando o cérebro responde a ameaças percebidas e cria preconceitos como um mecanismo de sobrevivência. Em resumo: seu cérebro vai criar automaticamente atalhos tendenciosos quando se deparar com experiências ou informações que são diferentes das que você já tem preconcebidas.
Além disso, seu processo cognitivo também tem influência em como o cérebro cria preconceitos. Em seu livro, Rápido e Devagar - duas formas de pensar, Daniel Kahneman identifica duas formas diferentes do cérebro formar pensamentos e eventualmente tomar decisões:
- Sistema 1: A forma automático, frequente, emocional e subconsciente
- Sistema 2: A forma devagar, lógica, calculadora e consciente
Kahneman explica que o pensamento do Sistema 1 é baseado em padrões e pensamentos existentes, em vez de se basear em novas informações e experiências. Esse sistema é responsável por criar preconceitos cognitivos e basicamente substitui o raciocínio do Sistema 2. Então mesmo que sua mente esteja focada nas atividades do Sistema 2, o Sistema 1 e seus preconceitos tomam conta e levam a uma tomada de decisão errada.
Quais atalhos do cérebro você está usando?
Aqui estão os pensamentos tendenciosos ou vieses mais comuns que seu cérebro pode ter e uma forma de ignorá-los na próxima vez que precisar passar pelo processo de tomada de decisão na sua empresa ou vida pessoal.
1. Viés de conveniência
Você coloca muito tempo e esforço para alcançar o sucesso no trabalho, na educação e em seus relacionamentos. Uma vez que você dedica muito tempo a esses empreendimentos, você quer total propriedade de qualquer sucesso relacionado a eles. Mas quando se trata de falhas, você corre delas na velocidade da luz.
Preconceitos ou vieses de conveniência lhe causam exatamente isso - você clama pelo sucesso e ignora suas falhas. Isso significa que quando algo bom acontece, você aceita o crédito, mas quando algo ruim acontece, você o culpa por fatores externos.
Pense quando você faz um exame na escola. Você atribui o sucesso a uma longa noite de estudos. Entretanto, se for mal no exame, estará mais propenso a encontrar uma razão externa para culpar, como seu professor não gostar de você.
Os vieses de conveniência podem se manifestar no trabalho quando você recebe um feedback. Ao invés de manter a mente aberta, acaba se colocando na defensiva quando o gerente ou membro de equipe está compartilhando um feedback ou uma crítica construtiva. Se você não aceitar seus defeitos e falhas, não terá a oportunidade de corrigir e melhorar no futuro.
2. Viés de sobrevivência
Quando se pensa na palavra ‘sobrevivência’, você deve estar tentando a cantar uma música do grupo Destiny’s Child (“I’m a survivor, I’m not gon’ give a up…”)
Assim como o Destiny’s Child, sobreviventes geralmente são idolatrados na cultura popular. Eles são comumentes referidos como “líderes de pensamento”, “pioneiros” e “inovadores”. Essas são as pessoas que trabalham duro, tem vidas de sucesso e recebem admiração e fama.
Mas e os perdedores e as falhas? David McRaney, autor do livro Você não é tão esperto quanto pensa, explica sobre preconceitos de sobrevivência nesse artigo que “após qualquer processo que deixa sobreviventes para trás, os não sobreviventes são geralmente destruídos ou removidos da cena. Se a falha se torna invisível, então naturalmente você prestará mais atenção no sucesso.” Por exemplo: você se lembra quem perdeu um campeonato ou ganhou uma medalha de prata nas Olimpíadas?
Quando você se concentra só no sucesso, os preconceitos de sobrevivência aparecem e te fazem pensar que é algo fácil, já que você só ouve histórias de pessoas que triunfaram.
Ao focar somente no sucesso, você está perdendo uma grande quantidade de informações disponíveis sobre falhas. As falhas podem ensinar várias lições e dar insights valiosos sobre como melhorar no futuro.
3. Viés da confirmação
O viés da confirmação é uma tendência a acreditar na informação que confirma seus preconceitos e pensamentos tendenciosos. Ao mesmo tempo, você ignora ou dispensa opiniões que discordam da sua, mesmo que elas sejam baseadas em fatos e válidas.
O viés da confirmação é um dos mindsets mais comuns que atrapalham o trabalho e o processo de tomada de decisão empresarial diário. Por exemplo, você foi designado para fazer um projeto de pesquisa de mercado para determinar em qual setor a empresa deve entrar no próximo ano. Você acha que deve ser no setor fitness, mas seus dados e pesquisas dizem o contrário. Ao invés de aceitar os dados que batem de frente com sua opinião, você começa a procurar fontes e informações, ou ainda fazer seus próprios testes, para provar que sua ideia é precisa e esse é a estratégia certa para a organização.
Even Warren Buffett luta ativamente contra seu viés da confirmação, reconhecendo-o e procurando informações que discordem de seus crenças. Para evitar o viés da confirmação, Buffet convidou o comerciante de fundos, Doug Kass, para uma reunião em Berkshire Hatthaway para que ele pudesse compartilhar suas opiniões divergentes às estratégias de investimento de Buffet.
Se isso não é motivo suficiente para desafiar seu viés de confirmação, tome o conselho de Albert Einstein, que uma vez falou:
“Se os fatos não se encaixam na teoria, jogue fora os fatos.”
4. Viés de ancoragem
O viés de ancoragem é a tendência de se basear fortemente em uma única informação (geralmente a primeira que você ouve).
É por isso que vale a pena ser o primeiro e oferecer uma média em vez de um número certo quando estiver negociando seu salário. A primeira oferta vai balizar as possibilidades na mente de cada pessoa. Então, se você permite que seu chefe ofereça um aumento de R$ 5000 por ano primeiro, e você está esperando ganhar R$ 10000 a mais, vai ser um pouco mais difícil mudar a cabeça dele ou dela durante a conversa de negociação. Nesse cenário, seu chefe está usando os R$5000 como ponto âncora, então, dobrar esse valor pode parecer excessivo demais.
5. Viés de modinhas
Segure seu chapéu e entre nessa dança. O viés de modinhas ocorre quando você adota uma crença só porque mais pessoas também possuem essa crença. Esse viés pode levar ao pensamento coletivo, que é uma tendência para que grupos se conformem às opiniões do líder.
Muitas reuniões de trabalho se tornam improdutivas devido ao viés de modinhas e aos pensamentos coletivos, porque os membros não se sentem confortáveis a desafiar o acordo coletivo ou nem percebem o seu nível de conformismo em relação às crenças do grupo.
Quando todos os membros da equipe concordam, é estabelecido um status quo que é difícil de desafiar. Em vez disso, você ouve desculpas como “Isso é como nós sempre fizemos”, o que pode prejudicar a evolução de toda equipe e organização. Por último, o viés de modinhas pode levar a uma queda na criatividade e inovação de sua equipe já que ninguém se sente à vontade para compartilhar diferentes ideias e crenças.
6. Falácia do planejamento
Se você é um gerente de projetos, deve estar reconhecendo esse comum viés.
A Falácia do Planejamento é a tendência de subestimar o tempo que as tarefas vão levar para serem feitas e não organizar seu tempo no trabalho da melhor forma. Além disso, ao invés de aceitar sua falha, você coloca a culpa em fatores externos como o atraso para começar o projeto ou dias que esteve doente.
Por exemplo, como um gerente de projetos, você tem habilidade de mapear os processos e cronograma, as atividades e duração necessária para cada tarefa ser entregue dentro do deadline. Embora você pense em cada passo, você pode subestimar quanto tempo cada tarefa precisará e esquecer de colocar um tempo para imprevistos que podem prolongar o projeto. Essa é a falácia do planejamento, trabalhando arduamente para minar o seu sucesso.
Muitas pessoas de sucesso caem na armadilha da falácia do planejamento: Elon Musk é conhecido por definir deadlines irreais que são sempre inevitavelmente adiados. Ele disse que ao longo do tempo trabalhou na melhoria dessa área.
7. Viés do ponto cego
Você chegou até esse ponto e ainda tem dificuldade de se ver nos exemplo que citamos? Você ainda acha que tem uma vida livre de pensamentos subjetivos e decisões irracionais? Você consegue pensar em alguém no seu trabalho que tem alguns desses preconceitos, mas você não?
Você pode agradecer ao seu viés do ponto cego.
Ele é a falha de reconhecer o impacto do preconceito no seu próprio julgamento. O termo foi criado por Emily Pronin, uma psicologista social da Universidade de Princeton, e seus colegas Daniel Lin e Lee Ross. Eles testaram mais de 600 pessoas nos EUA e descobriram que 85% deles acreditam que possuem menos pensamentos tendenciosos que a média dos americanos. Somente um participante acreditava que ele ou ela tinha mais pensamentos tendenciosos que a média. Além disso, a maioria desses participantes conseguiram identificar os viés cognitivos mais facilmente em outras pessoas que em si mesmos.
“Nós somos cegos à nossa cegueira. Nós temos uma pequena ideia do pouco que sabemos. Nós não somos projetados para saber o pouco que sabemos”, disse o pesquisador de preconceitos Daniel Kahneman. Então, apesar da extensa pesquisa e dados que apoiam a existência dos preconceitos cognitivos, muitos de nós discordamos e até mesmo ignoramos os efeitos desses vieses nas nossas vidas, mesmo quando estamos plenamente conscientes disso.
Formas produtivas de manter seus preconceitos sob controle
Seus viés fazem parte de você, assim como as memórias e experiências contribuem para eles. Mesmo que eles não possam ser removidos, eles podem ser reconhecidos e alterados. Ao se conscientizar ativamente de seus pensamentos tendenciosos e ao praticar essas estratégias, você produzirá opiniões objetivas e tomará decisões mais racionais:
- Pratique auto críticas e reflexões honestas
O primeiro passo para dominar seus preconceitos é através da conscientização. Uma vez que você esteja ciente deles, é importante refletir regularmente sobre suas decisões e criticar-se de forma gentil e honesta. Você tomou aquela decisão baseada em preconceitos ou em pesquisas e fatos que iam contra suas crenças? Quando foi a última vez que você desafiou uma estratégia no trabalho que você não concordava?
- Desafie-se a pensar de uma maneira específica
Você pode se basear na neuroplasticidade auto-dirigida para treinar seu cérebro a pensar de uma certa forma. Neuroplasticidade é a habilidade de seu cérebro se reorganizar, tanto fisicamente como funcionalmente. Através da meditação para atenção plena, Michael Taft, autor do livro The Mindful Geek (sem tradução no Brasil), explica nesse podcast que você pode atingir um nível de modelagem do cérebro que permite pensar diferente e eventualmente contrariar seus preconceitos. Mesmo o cérebro sendo preguiçoso, você pode tomar o controle e começar a mudar seus neurônios e sinapses para alcançar pensamentos objetivos através desses processos.
- Diversifique sua equipe
Um time diversificado traz várias opiniões, experiências, valores e metas à mesa. Ao construir esse time, você terá a oportunidade de evitar as armadilhas dos preconceitos cognitivos comuns. Os membros das equipes desafiarão a visão do mundo uns dos outros, resultando em diferentes estratégias de sucesso para atingir as metas do negócio.
Preconceitos podem acontecer sem esforço e até mesmo sem a consciência de sua influência. Você tem o poder do cérebro de prevenir ativamente que eles atrapalhem seu trabalho. Você só precisa de momentos de auto reflexão para conseguir uma perspectiva mais enraizada de pensamentos racionais e objetivos.
Seja algo negativo ou positivo, adoraríamos ouvir o que você acha. Siga-nos no Twitter (@trello)!